terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Meu jardim,

Tô relendo minha lida, minha alma, meus amores
Tô revendo minha vida, minha luta, meus valores
Refazendo minhas forças, minhas fontes, meus favores
Tô regando minhas folhas, minhas faces, minhas flores
Tô limpando minha casa, minha cama, meu quartinho
Tô soprando minha brasa, minha brisa, meu anjinho
Tô bebendo minhas culpas, meu veneno, meu vinho
Escrevendo minhas cartas, meu começo, meu caminho

Estou podando meu jardim
Estou cuidando bem de mim

sábado, 6 de dezembro de 2008

Não vai passar,



Ela tinha medo de que as palavras perdessem a alegria da primeira leitura. Talvez, por isso, tentava se controlar para não decorar cada uma delas. Para não conseguir ouvir, saindo da boca dele, tudo aquilo. Para não ler além daquelas linhas nem se perder no mar de incertezas que surgia diante de si. Mas tudo isso era tão difícil, que aos poucos, a tranqüilidade de ver seus sentimentos expostos naquela janelinha online do MSN cedia lugar a um milhão de dúvidas que pareciam lhe corroer as idéias e o tempo. Ele entendeu o que eu quis dizer? Entendeu que eu disse que passaria (se Deus quisesse) apenas como uma tentativa, quase desesperada, de fazê-lo compreender que somos amigos antes de tudo?

Devaneios. Ela não esperava por aquela inquietação. Podia jurar de pés juntos que os olhares nunca haviam sido intencionais – muito menos para ele. Fazia questão também de deixar claro o quanto se sentia despreocupada com o desenrolar da recente história, que para ela, sinceramente, não chegaria a lugar nenhum. Não por ela. Ah, mas aquela inquietação.
Meu Deus, como agora tentava não pensar, esquecer, apagar da memória! Mas já não era possível. Bastavam alguns segundos de distração para a cena lhe vir à mente e parecer lhe atingir a alma. Seu rosto bem próximo ao dele. As mãos entrelaçadas e apaixonadas – elas já se gostavam antes deles descobrirem-se juntos. Sua boca agora chegava àquele mesmo rosto que, a pouco tempo, enxergara tão próximo de si. Ela, então, lhe dava um beijo na bochecha, enquanto ele fechava os olhos. Devaneios.

Diante da tela do computador, lia mais uma vez aquelas palavras, na mesma janelhinha do MSN - agora offline. “Quando ele tiver on perguntarei se entendeu tudo e direi logo, ‘não vai passar’”.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008


Eu sei que você estava esperando por um texto. Mas não quero quebrar o charme.

Parabéns pai!
Amamos você!

terça-feira, 25 de novembro de 2008

A dor que deveras sente,

Ela abriu os olhos e voltou a fechar. Acreditava ser a quarta ou quinta vez que repetia, vagarosamente, o mesmo movimento. Sentada em sua cama, não viu o tempo passar. Imóvel. Mais uma vez, abriu os olhos e deixou que escorresse pelo seu rosto uma das incontáveis lágrimas que ainda iria derramar.

Ele era o homem da sua vida. Ela sabia disso. Era ele o futuro pai de seus filhos, seu marido, seu companheiro, seu amigo e maior amor. Eles não nasceram um para o outro. Ela sempre cheia de esquisitices, ele sempre cheio de piadinhas. Mas viveriam um para o outro. Completar-se-iam e admirariam suas diferenças. E ela tinha tanta certeza disso. E assim devia ser.

Em seu quarto, ouvia-se apenas o tic tac do relógio. Apesar dela não se dar conta, sua dor não fora capaz de parar o tempo. A cada fechar de olhos, renovava as quase então perdidas esperanças. Ela iria vê-lo entrar por aquela porta, segurar suas mãos e lhe dizer o quanto a amava e seriam felizes.
Bobagens. Ilusões que se desvaneciam e cediam lugar ao impulso de encarar a dura realidade. Era preciso abrir os olhos.

Foram anos amando em silêncio. Quantos projetos para o futuro. Planos para um tempo em que se sentiria segura para falar sobre os seus sentimentos – os melhores e maiores. Todos eles para o responsável por tantas noites insones e tantas manhãs primaveris.

Ele se fora. Se fora sem prenúncios. Sem lhe avisar que a vida era curta e que cada oportunidade deveria ser reconhecida como única. Reconhecia-se agora ela diante da dor. Era morte. Era a morte dele que estava matando-a. Acidente de carro. Acidente de percurso. Acidentes da vida.

Ele já não mais saberia daquele amor. Ela já não mais poderia lhe dizer o quanto sentia.
Fechou os olhos, mais uma vez, sentindo ter ele bem próximo de si – mesmo sabendo que nunca mais poderia vê-lo e percebendo o vazio transformando-se em saudade.
Abriu novamente. Enxugou todas as lágrimas que lhe molhavam o rosto, e que nesse momento eram muitas, desligou o relógio e se levantou para buscar caneta e papel. Era preciso escrever.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Quisera ela que assim não fosse,

Eu você e todos os encontros casuais
os ais e os hão de ser e todos os casais também
olha, acho até que quem achou que nunca ia
esse ia se espantar de ver que o ódio e o amor
e até eu vou pra ver no que vai dar
a massa a moça
e até esse pra sempre

tudo passa.


quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Jorge Henrique



Ele tinha nome de avô, provavelmente nascido na década de 20 ou 30. Podia também ser nome de galã de novela mexicana, daqueles que sofrem por amor e salvam a mocinha ao final da trama. Seu jeito era de menino recém chegado do interior, trazendo na mochila a saudade de casa e uma gama de valores e princípios vindos de uma família muito bem estruturada. Mas o que mais chamava atenção era o olhar. Olhar carregado de pureza, diferente daquela beirando a infantilidade e a bobeira. Era uma pureza madura, que gritava para ela a eterna criança que ele seria e se desvendava num sorriso capaz de acolher o mundo.
Não fosse o tamanho de sua cabeça, ela tinha certeza que o levaria para sempre num potinho. A vontade era essa: tê-lo, todos os dias, a seu lado. Mas isso já não era possível. Aqueles dias de aula pareciam chegar ao fim. Ainda faltavam alguns períodos (talvez metade de uma recente caminhada) e o tempo voava. E a cada dia, a certeza - o mundo era pequeno demais para ele. E ela sabia disso.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Conversa infantil, para Baré

- Pedro...
- Que foi?
- Ah nada. (...) Você tá tão mongol hoje.
- O que?
- Ah, nada.
- Tava pensando Manu... é que às vezes, te vejo olhando muito pra mim.
- Eu te olhando? Ah, Pedro... acho que quem olha aqui é você! E é você pra mim.
- É, tenho olhado bastante mesmo. Mas, você também. Então eu pensei que quando isso acontece, sei lá, isso de duas pessoas se olharem muito, deve ter um motivo, não deve?
- É deve. Você viu a professora hoje? Achei que ela não fosse liberar a gente! Tô morrendo de fome.
- Deve o que, Manu?
- Deve ser a Lei da Atração: VOCÊ me olha e por isso, eu te olho.
- É. (...) Manu...
- O que?
- É... (...). Também achei que a professora nem fosse liberar a gente hoje. Tava super cansado da aula já.
- Pois é. Mas, Pedro, qual motivo você acha?
- Não sei.
- Então tô certa. É a Lei.
- Mas tem que ter um motivo menina, pra essa Lei ai, de VOCÊ me olhar e me fazer te olhar.
- Menina? Nossa, que delicadeza de mongol!
- Ah Manu, tô falando de sentimento.
- (...)
- E sentimento pode ser bom e ruim. Antes de te conhecer já te via de olho em mim.
- Ih Pedro, não viaja.
- É, chega de viagem. E hoje, você vai na festa da sala?
- Vou sim! Você vai né? Vai ficar me olhando, mongolzinho?
- Agora que você vai, eu vou. Só pra ficar te olhando.
- Então tá bom! Até que você é engraçadinho!
- Manu... (...)
- Pedro... (...)
- Que horas são?
- Ah deve ser perto de uma hora. Estamos andando tem uns dez minutos no máximo.

...

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Ainda há tempo



Ela estava a alguns quilômetros de distancia. Mas era como se estivesse lá. Conseguia sentir o cheiro do mar, o vento fino batendo no rosto e o peito parecendo explodir de alegria. Se fechasse um pouco mais os olhos poderia ainda ver o mar. Ver as pessoas que passavam por ali, que acenavam para ela com uma receptividade inconfundível. Agora, ela já podia também ouvir o barulho das ondas quebrando e aquele sotaque. Ah, aquele sotaque que lhe amolecia a alma. Difícil era entender todas as palavras e traduzi-las para o seu “mineirês”. Mas fácil era notar como cada uma delas apresentava-se carregada de brasilidade e, assim, no fundo, todos falavam a mesma língua.
“Oxe lindinha, vai ficar ai na porta? A casa é sua”. E agora, ela entrava naquela casinha cor-de-rosa, recém pintada de Fazenda Coutos. Quem lhe abria a porta era Dona Alda. Dona de um abraço aconchegante, de um sorriso largo e de uma pureza quase infantil, que lhe disfarçava a força, a coragem, a determinação e a Fé.
Ali dentro, estavam crianças, jovens e adultos, todos moradores de Coutos. Rostos novos e desconhecidos. Expressões amigas e olhares acolhedores. Aquelas pessoas, as quais via pela primeira vez, mostravam-se carregadas de significados e a identificação parecia ser completa. Sem preconceitos, distâncias ou diferenças. Eram todos iguais. E mais do que isso, pareciam todos, um único ser.
Sentada no sofá, ao lado de sua irmã – responsável por aquele encontro único e inesquecível – ela parecia registrar com os olhos e o coração cada momento, cada palavra e cada sensação. E aos poucos, saia de lá.
Em alguns segundos, sobrevoava o oceano, passava por Porto Seguro, Ilhéus e Governador Valadares e, logo, estava em casa – de frente para o computador, três meses depois daquela viagem. Três meses para compreender que não seria necessário um texto formal, com palavras rebuscadas e concordância perfeita. Ela queria sim, escrever o seu melhor, para que pudesse ser justa ao que sentiu vivenciando tudo aquilo. Mas isso seria impossível. Optou, então, pela simplicidade. Simplicidade essa, que entendeu apenas quando voltou da casa de Dona Alda.
Agora, distante de uma realidade que já não parecia lhe pertencer, lutava para conservar o momento gravado em sua alma, o que definitivamente não era difícil. E desejava transformar o amor que sentira naquele dia em trabalho e serviço para a humanidade. Afinal de contas, sabia da existência de inúmeras “Fazendas Coutos” espalhadas por aí.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

"É que a lembrança vem com a saudade.
Quando a saudade a vem não dá pra segurar".

domingo, 26 de outubro de 2008


Se olhar e não se reconhecer. Ela não tinha nem 20 anos completos e já experimentava aquela estranha sensação. De onde vinha o riso rasgado? Certamente, tinha a mesma origem daquelas respostas irônicas e do jeito decidido. Ela, que até então se perdia em suas dúvidas, via-se, agora, segura em perceber-se repleta de possibilidades. O medo da “única escolha” transformara-se em desejo de abraçar todas elas.
A ironia lhe servia como luvas. Embora fosse necessário conhecê-la para perceber, tal recurso perdia toda sua sagacidade quando acompanhado da doçura de seus gestos e da pureza que, sim, ainda existia em sua alma. A mudança parecia repentina. Ela ainda se assustava em perceber a ausência da timidez, sua antiga companheira, e já não mais gostava – e aceitava – quando ela insistia em dar as caras.
Por várias vezes fixava o olhar no espelho: a busca desesperada por elementos que pudessem lhe caracterizar aos poucos foi sendo substituída por uma curiosidade do que ainda estava por vir. Em quem ela se transformaria?
Perdida em tantas novidades, já não era possível distinguir características. Todas elas se misturavam e terminavam por compor quem ela era, foi e seria.
E olha que muito – quase tudo – ainda estava por vir.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Família Sentimento

Tristeza. Alguns dias acordava imponente, sagaz e atuante. Vestia-se da maneira mais elegante e não se esquecia do perfume, para deixar, por onde passava, um rastro de seu cheiro. Alimentava-se dos melhores sabores e, ao fim do dia, colhia os melhores frutos, quando ia de encontro ao Amadurecimento.

Amadurecimento. Senhor das horas, dos tempos e dono de uma sabedoria invejável. Sempre tão compreensivo e amigo, raramente deixava transparecer sinais de inquietude e insatisfação. Mas, quando encontrava-se inesperadamente com a Tristeza, assumia uma infantilidade que não lhe era peculiar e uma vontade de provar, para a Alegria – que bem a sua frente estava – toda a sua imaturidade, revertida em um choro de criança. Em um chorinho.

Alegria. Uma graça! Mas por ser, sempre, tão desejada, deixou que a soberba lhe invadisse o coração: apresentava-se só quando lhe era conveniente. Suas aparições costumavam ser grandiosas e repentinas. E, da maneira inesperada como chegava, partia, deixando lembranças e saudades. Nesses momentos de glória, diferente da Tristeza, Alegria fazia uso de um perfume discreto, capaz de ser percebido apenas pelos mais atentos e sensíveis à sua presença. Esses, não precisavam enxergá-la para senti-la.

Emoção. Era ela a mãe da Tristeza, do Amadurecimento e da Alegria. Seu maior esforço era dedicado às tentativas de transmitir aquilo que aprendera com seu marido, pai de seus filhos, o senhor Razão. Não era fácil perceber que seus três pequenos haviam dado ouvidos ao que dizia. Afinal de contas, Emoção era dona de um temperamento forte e, por vezes, se esquecia dos conselhos do senhor Razão. Mas, nos momentos em que marido e mulher – Emoção e Razão – se encontravam, às vezes, já tarde da noite, era como se transformassem em um. E, só então, era possível compreender quão unida era aquela família.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Trio dos sonhos

Triângulo. Seus melhores amigos eram a sanfona e a zabumba. E apesar de toda essa amizade, não precisavam tocar no mesmo trio: o que os ligava eram os passos daquela menina. Quando se sentia feliz, como naqueles finais de semana que já estavam se tornando habituais, era capaz de dançar! Absurdamente, deixava seu trim trim trim embalar sua própria dança – movimentos desengonçados, que iam do samba ao maculelê, candomblé ou coisa mais parecida a um ataque epilético. Mas o que o deixava mais realizado, era quando seu dono, moço bonito dos olhos de mar, cantava as modas do sertão e traduzia em forró pé de serra, todo o seu amor por aquele ritmo. A emoção era tamanha, que nas mãos daquele mano véio dos olhos verdes, triângulo tilintava como nenhum outro e transmitia seus melhores sentimentos aos forrozeiros de plantão, que se balançavam à sua batida.

Zabumba. Particular como só ela, guardava um mistério capaz de colocar medo naquela forrozeira, ainda menina. Seu som, diferente de si, já era por ela bem conhecido, mas nunca previsível. A menina via-se, sempre, surpreendendo-se com o bum, que parecia gritar para ela, qualquer coisa impossível de discernir. No entanto, quando era possível observá-la bem de pertinho, como pouquíssimas vezes foram possíveis, podia-se notar o mesmo brilho e alegria do triângulo. Sim, a zabumba deixava toda sua aparente prepotência e vestia-se de uma emoção quase infantil, compreensível só por aqueles que amam tocar e que encontram na música razão para viver. E quando isso acontecia, ela também olhava para a menina e, embora ambas não entendessem porque se olhavam, admitiam uma paixão em comum e mandavam, juntas, apagar o lampião, “que a dança só é boa na escuridão”!

Sanfona. Ah, foi a sanfona quem realmente conquistou aquela menina – bonitinha – que admirava o triângulo e gostava da zabumba. Não se pode dizer ter sido paixão à primeira vista. Foi curiosidade. A menina, em frente ao palco, revelava-se pequena diante de toda imponência do fole e esforçava-se para entender como aquele “cabra macho” tão pequenininho era capaz de guiar o som à sua maneira, fazendo seu coração bater e seus olhos não obedecerem mais às suas ordens. Tudo a sua volta era a sanfona. E o dono da sanfona. E melhor do que ouvi-los, era descobrir-se cada vez mais encantada com aquele universo. “Até os pisões de pé, nos forrós, tornavam-se suportáveis”.

O trio. Não de forró, mas de forrozeiras. Nem o triângulo ou a zabumba e a sanfona conseguiriam, naquele contexto, compreender e fazer jus à amizade que brotava tão recente e já tão madura. Importância dos três instrumentos à parte, quando elas dançavam, não eram mais as pequenas diante do palco. Eram grandes. Eram felizes. E eram, antes de tudo, afinadas àquela realidade. Àquela realidade que delas era.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Top Marcas

- Bom dia! O senhor é lojista?
- Bom dia. Sou sim.
- Preenche, por favor, o cadastro ali no balcão? Um só por razão social é suficiente.
- Esse ano de novo? Tem que cadastrar todo ano? Ai, meu Deus.
(...)
- Boa tarde! A senhora é lojista?
- Não.
- Representante?
- Não.
- Fabricante?
- Não.
- Curiosa?
- Sim.
- A feira é só para lojistas. Mas vou liberar pra senhora, com crachá de visitante. Seu nome, por favor.
(...)
- Boa noite! Esqueci meu crachá no hotel. Luiz Eduardo, estande 411.
- Bom dia! Preciso entrar pra encontrar meu marido que está visitando a feira.
- Boa tarde! Sou representante e lojista, como faço pra entrar?
- Bom dia! A feira vai até que dia?

Meu Deus, posso parar pra tomar uma água?

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Flor de Lis



Joana sentia-se sem ar. Queria procurar o lugar mais arejado do forró, um ventilador ligado ou uma janela que permitisse qualquer resquício de brisa, capaz de varrer dali tudo aquilo que estava sentindo. Mas não era possível. Ela não conseguia desviar, por um segundo que fosse, os olhos daquela barriga.

À sua frente, uma mulher desconhecida, ainda com cara de menina, não fosse aquela barriga, anunciando 4 meses. Joana nunca a tinha visto, mas sabia o seu nome, onde morava e talvez parte do capítulo mais importante de sua vida. E naquele momento, em que encontravam-se tão próximas, ela pôde compreender - como mulher que Joana também era - o significado de possuir uma florzinha em desenvolvimento dentro do ventre.

Seu coração palpitava e o ar parecia tornar-se mais denso e escasso. Era uma menina. Ela já não ouvia as músicas que tocavam nem as pessoas a sua volta. Como se chamaria a criança? Joana não ouvia nem aqueles que a chamavam para dançar. Será que irá se parecer com quem? Com o pai ou com a mãe? De pé, diante do grupo de amigos daquela mulher que lhe prendera tanta atenção e fora motivo de tantos sentimentos desencontrados e inéditos desde julho, quando soubera da notícia, já não sabia onde estavam os seus próprios amigos. Tomara que a menininha não nasça com o tamanho da cabeça do pai. Mas que herde seu sorriso, seu olhar de entendido quando levanta a sobrancelha esquerda e, sobretudo, seu desejo de desenvolvimento humano e espiritual.

“Que barriga linda, levanta a blusa! Quantos meses já?”. Foi o suficiente para Joana voltar à realidade do forró. Ela já sabia a resposta, mas inclinou-se para escutar a voz que iria responder “4 meses!”, essa mesma voz que iria orientar, dar broncas, educar e dizer “filha” incontáveis vezes.

Encontrou os seus amigos e ficou tranqüila em perceber que o ar, aos poucos, voltava a lhe ser suficiente. Dançou, riu, conversou, conheceu gente. Ainda estava abalada com a lembrança dos momentos anteriores, em que se viu absorta em tanta confusão. Mas, aquilo tudo já não lhe pertencia. Joana podia ser livre. Era jovem e muito ainda estava por vir. “Isso deve ser a vida”, pensava ela, percebendo-se um pouco mais madura depois da recente experiência. Na porta do forró, já na hora de ir embora, Joana virou-se para o salão e lançou, docemente, um último olhar àquela mulher. E ela sabia que seria o último.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Predo pelo correio,

Dessa vez ela teria que sair da frente do computador para escrever. Fazia tempo que isso não acontecia, mas era exigência básica da situação: Luiza, você vai ter que usar caneta e papel. Afinal, cartas enviadas pelo correio se escrevem à mão.

As palavras já não fluíam com a mesma facilidade observada na feitura dos primeiros textos, quando pareciam saltar de suas idéias, preenchendo a tela branca do Word. Ela atribuía esse inconveniente bloqueio à nova versão que assumia, pela quarta vez, desde que ingressara na vida universitária. “Uma vida por semestre”, pensava ela no início do seu quarto período, acostumando-se a perceber vários ela, eu e Luiza dentro de um mesmo corpo – que, por pouco não atingiria 1,60m.

Olhando para si, ela não conseguia entender como que, no interior daquele ilimitado espaço (1,60m apenas!), encontrava-se tamanha multiplicidade. E foi preciso olhar para ele, que estivera sempre ao seu alcance (com seu semelhante 1,60m), apesar de tão distante, para compreender o que lhe parecia incoerente. Ele, 19 anos, de sobrenome Oliveira Azevedo.

Hoje, ela, com também 19 anos, já não se lembrava mais a primeira vez em que escutou a professora dizer Pedro Henrique durante a chamada. Como o tempo havia passado rápido! De pega-pega no pátio do colégio, às festinhas com direito à presença da “querida professora”, não se esquecendo da descoberta das primeiras letras, sílabas e palavras, eles chegavam agora à vida adulta. E isso seria, durante aqueles dias de correria e estresse, resumido a depoimentos no Orkut, conversa jogada fora no MSN e, quando muito, no telefone para matar as saudades. Não fosse aquela segunda-feira.

Receber notícias de seu amigo pelo correio lhe fez perceber quão prepotente é a tecnologia. Toda essa modernidade, que se diz capaz de encurtar a distância, nunca lhe fez sentir tão próxima de alguém quanto aquela cartinha de duas páginas.

Ela já sabia de muito daquilo que estava escrito ali: rotina de estudos e estágios, carteira de motorista nas mãos, saudades e lembranças de um tempo que não volta e de amigos que já não fazem parte de nossa rotina. Mas, ler tudo aquilo, escrito pelas mãos de um dos seus mais antigos amigos, reavivou todo o carinho que sempre existira dentro de si e a permitiu ler além daquelas linhas: eles eram amigos de verdade. E eram amigos para sempre.

Tinha medo de sua resposta não ser à altura. De não conseguir retribuir tamanha simplicidade, sinceridade e amizade. Além disso, sua letra já não era das mais bonitas. Na faculdade, quando alguém lhe perguntava “o que que tá escrito aqui? É mandarim?”, ela gostava de lembrar - e contar, claro - do amigo que dizia ser a sua letra (o mandarim dela, dá pra acreditar?!) a mais linda da sala, com toda a pureza de uma criança aos 7 anos de idade.

Pronto. Sua resposta estava feita. Não como desejava ou escrita à mão. Mas carregada de saudades e alegrias. Torcia para que ela chegasse rápida ao endereço escrito no verso do envelope: a tempo dele lê-la antes de acessar o Blog. Afinal, sua ansiedade condizia com as facilidades tecnológicas - ela não estava habituada a cartas e correios.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Baianidade

Férias. Como precisava de férias! Passou todo o mês de junho acompanhando a passagem do tempo pelo calendário. Ao final de cada dia, um “x” a mais naquela folhinha. Pensou que não conseguiria suportar a espera: dia 4 de julho estava longe demais.

Agosto. Como o tempo havia passado rápido! Assim como não viu dia 4 chegar – e passar – não teve tempo de sentir, com a vagareza merecida pelas circunstâncias, todos os detalhes do mês de julho. E agora, já de volta a sua rotina habitual, que apesar do habitual, nada se parecia com a anterior, tentava reorganizar os pensamentos, para que, em vão, pudesse reorganizar a si mesma. Ela percebia algo diferente em seu modo de falar, em sua relação com o próximo e até na própria tolerância consigo.

De frente para o espelho, podia notar novos gestos e um brilho no olhar com outras perspectivas e desejos. Surpreendia-se olhando para a própria barriga, grande, que também era nova! Mas logo desviava a atenção para as mãos, para os pés e era inevitável encontrar seu próprio olhar. Tudo muito recente. Precisava escrever. Um mês indo à praia, muito sol e forró na cabeça, um pouco de axé, Itaúnas, Conceição, Salvador, Pelourinho, Guarajuba. Tudo muito bom, meu Deus. Tudo contribuindo para a sua “baianidade” e, agora, as palavras não vinham mais. Nada é perfeito. “E ainda bem”, pensava ela, “que as férias não duram para sempre”.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Para o Gabri,

Incrível como o tempo lhe escapou pelas mãos. Já havia se passado um ano e a data só lhe ocorrera um mês após. Assustada com a repentina recordação, tentou desesperadamente lembrar o que estaria fazendo naquele dia, algum pensamento, algum desejo, um fechar de olhos acompanhado por um suspiro. Algo que sugerisse uma lembrança. Mas era em vão.

Ela já não gostava dele como antes. Já não pensava nele todos os dias. E sentia-se feliz ao vê-lo com a nova namorada. Mas ainda era estranho ver seu nome na lista “online” do MSN e não perguntar sobre o seu dia. Ver suas fotos novas no Orkut e não reconhecer rostos amigos e momentos compartilhados.
Diante de toda a sua imaturidade, ela não compreendia porque não podiam ser amigos. Ela havia errado, ele também. Ela havia pedido desculpas, ele também. Eles já haviam se gostado. E era fácil perceber que, “das coisas dessa vida, nunca haviam sentido”. E tudo se passou. E agora, não podia ser em vão.

Seus primeiros 19 anos de vida seriam, quando adulta, parte de um tempo distante. Sentia medo de não se lembrar, com os detalhes que desejava, daqueles dias que não voltariam mais. Do bolo de maçã com canela, da poesia recém escrita ou daquela música desafinada. Também das meias pretas da mãe, motivo de tanto riso. Mas era impossível colocar em questão a ternura que sentiria, para sempre, por aquelas pessoas que por sete meses conquistaram seu encanto, sua admiração e, sobretudo, seu amor.

Não foi preciso muito tempo para ela gostar de passar algumas horas dos seus sábados na Blunt. Nem muito sacrifício para aprender nomes complicados de manobras complicadíssimas, realizadas em cima daquele skate. E ela agora compreendia como havia, durante esse tempo, colhido argumentos sólidos a respeito do melhor shampoo a ser usado ou da técnica “ultra, mega, hiper, ultra poderosa”, para deixar os cabelos mais poderosíssimos.

Ela mergulhou em um universo completamente novo. E sentia-se veterana ali. Fora acolhida com amor de mãe e irmão. E não havia espaço para se colocar em questão o grau de familiaridade daquelas pessoas, tamanho o carinho que demonstravam.

Agora, oito meses após ter deixado esse mundo, e segura de que fizera o certo, pegava-se, por vezes, imaginando os dois juntos: mãe e filho mais novo. O que estariam fazendo, as provações vividas e mais uma vez superadas, tudo isso já não estaria mais ao seu alcance. Mas, alegrava-se ao volver-se para aquilo que de melhor havia restado de seu primeiro namoro: não era preciso olhar para trás. Ela já sabia que termos como “ex-segunda mãe” e “ex-irmão postiço” não existiam.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Aviso

O blog não está abandonado. Ela, e eu, esperamos voltar a postar logo!

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Dona Maria e Senhor José

Ela havia acabado de desligar o chuveiro quando o telefone tocou e sua mãe atendeu. Não era possível escutar os detalhes da conversa, mas podia distinguir algumas palavras isoladas: hospital, exames... diagnóstico. Sentiu-se como Fanis Iakovidis, interpretado por Markus Osse, em O Tempero da Vida. A personagem receava o tocar do telefone, por acreditar vir sempre uma notícia desagradável do outro lado da linha. Não que ela pensasse em mil tragédias sempre que o aparelho emitia seu ruído anunciando uma ligação. Mas, naquele momento, quando sua mãe perguntava a respeito do estado de saúde de sua avó, ela, que mal havia se enxugado e já se apresentava ao lado do telefone - onde tudo se passava, não pôde deixar de temer pelo o que escutaria.

Algumas horas depois, estava diante do quarto 850 do Mater Dei. A porta parecia maior do que a que vira um mês atrás, quando era seu avô o internado. “Pensei que demoraria mais para vê-la de novo, mas aqui estou novamente”, foi o que disse para a porta 850 de cor goiaba e fechadura dourada.

Aquelas mãos - incapazes de esconder o passar dos anos e as vivenciadas 79 voltas da Terra ao redor do Sol, tremiam e já não eram suficientes para sustentá-la quando desejava mudar de posição na cama. Ela cresceu ciente da ordem natural da vida: primeiro se vão os avós, em seguida os pais. E apesar de se achar equilibrada, capaz de compreender a naturalidade dos acontecimentos inerentes à condição humana, percebia-se assustada em ver aquelas mãozinhas tão brancas tremerem sobre a sua própria mão, quando uma acariciava a outra.

Seu avô não poderia dormir no hospital. Ainda estava se recuperando da queda que lhe valera uma cirurgia gástrica e das demais, menores, mas responsáveis por um roxo no joelho, um arranhão no braço e uma bengala nas mãos. E por esse motivo, teria que ir embora.
Ela já estava com seus pais, ao lado da sua conhecida porta de cor goiaba, esperando pelo avô para levá-lo em casa, quando pôde ver Seu José despedindo-se de Dona Maria – um casal de velhinhos, casados há mais de meio século e desacostumados com as implicações de uma vida beirando aos 80 anos. “Amanhã cedinho estou aqui de novo”. “Tem leite na geladeira e aquele biscoitinho que você gosta no armário”.

domingo, 6 de julho de 2008

Sobre Ela e ela,

Escritório. No escritório, ela era séria e serena. Demonstrava sempre uma segurança invejável, capaz de esconder qualquer vestígio de fragilidade existente dentro de si. Salto alto ou bico fino. Saia até o joelho. Os óculos, usava quando conveniente. E gostava de ser chamada por seu nome e sobrenome, transmitia maturidade e a impressão de uma idade, que ela ainda não tinha.

Faculdade. Na faculdade, outra atmosfera. Rodeada de amigos – não muitos, mas verdadeiros – podia falar bobagens, soltar sorrisos e abraçar expectativas, medos e desejos. Calça e camiseta. All star e sandália rasteira. Apesar dos estresses e frustrações, acompanhados de trânsitos intermináveis, provas insuportáveis, ônibus lotados e contínua correria, era feliz e apaixonada com cada compromisso que compunha sua rotina. Não era sacrifício nenhum tudo isso. Era prazeroso, sobretudo, quando ao lado de companhias tão especiais. Tão preguiçosas, por muitas vezes, e tão cheias de energia, como ela. Ah, e ali, a chamem pelo apelido, por favor.

Casa. Sempre descalça, quando muito, uma meia nos pés. Short, calça de capoeira, camiseta e moletom. Um ou outro. Ou todos ao mesmo tempo: em casa, todo mundo é da família, uma intimidade só. Ali podia ser ela mesma. Extravasar sua raiva, chorar até de madrugada sem saber o motivo, realizar suas comemorações – de maneira ridícula, aos olhos de estranhos. Podia ainda, ser infantil e fazer pirraça. E apesar de saber de todas essas possibilidades, gostava mesmo de conversar com seus pais. Estar atenta à tudo que lhe servia como aprendizado. Procurava aproveitar os anos de sua vida que passaria naquele lugar, junto daquelas pessoas. Seu nome ali? Filha bastava.

Forró. Apertado, cheio. Como faz calor nesse lugar! Mas, de toda a sua rotina – sim, o forró estava incluído em sua rotina – era onde se sentia mais dona de si. Carregava consigo todas as suas inseguranças, os seus defeitos e problemas. Mas tudo isso tornava-se pequeno diante da alegria que sentia ao encontrar os amigos e dançar uma, duas, três, cinqüenta músicas. Sentia-se dona de si, pois se reconhecia humana em meio a tanta diversidade. Ali não estava um grupo de pessoas, chamado por outros como forrozeiros. Cada um ali trazia uma história, um estilo e uma bagagem de vida, e eram capazes de conservar sua individualidade justamente quando uniam-se a todos, sem qualquer restrição. Ricos e pobres. Brancos e negros. Homens e mulheres. Todos amigos e iguais. Seu nome ali eram vários: além do seu próprio, apelidos não faltavam. E havia quem nem o soubesse. Short, calça, camiseta, sapatilha ou sandália rasteira. A roupa ali não importava, desde que fosse confortável para dançar. Para dançar a noite inteira.

Vida. Múltiplas personalidades, múltiplas versões – se é que assim podiam-se chamar as várias posturas que assumia em seu cotidiano. Sabia que não importava o lugar, a roupa, quão confortável ou animada estava para mostrar quem era, essencialmente. Bastava a observar, com um pouco mais de critério e sentimento, para perceber sua essência, a mesma, em todas as situações: ela era e vivia, sempre, toda a sua própria diversidade.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

E quero que vocês venham comigo,

Ela reconhecia-se jovem e, realmente o era. Sabia que muito, ou quase tudo, ainda estava para conhecer: amigos, amores, colegas. Ansiedade nunca fora uma de suas características marcantes. Mas o mundo, hoje, mostrava-se tão grande diante de si, que era impossível não ansiar pelo futuro. Havia lido, dia desses, que a ansiedade manifestava-se em outro blog num rápido piscar de olhos. Desejava que a sua transbordasse de alguma forma, para que pudesse extravasar e quem sabe, diminuir. Mas aqui, ela parecia paralisar. E pensando nisso, via até com certa alegria o “lentificar” dos gestos, dos pensamentos e das conversas. Talvez assim, fosse possível contornar justamente aquilo que lhe provocara tal inquietação. Esse mesmo mundo, definido como grande demais, era também rápido demais. Conhecia e desconhecia pessoas a todo o momento. Não havia tempo, nem oportunidade, para solidificar como desejava as relações com cada um que considerava especial. E assim assistia, com o coração apertado, se distanciarem grandes amizades, se desfazerem amores belíssimos e se enfraquecerem parcerias incríveis. Descobriu então, que todo o seu amor desdobrava-se em saudade e queria oferecer, para cada um que se afastasse, o que de melhor possuía. E queria ter a sorte de encontrar aqueles, e aquele, que ficariam para sempre em sua vida.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Sobrevivemos,

E amanhã estaremos de férias!

terça-feira, 24 de junho de 2008

Criança,

Rodoviária Conceição da Barra

- O que que é isso aí no seu nariz?
- É um brinco!
- Mas no nariz? Posso colocar a mão?
- Pode sim. Quantos anos você tem?
- Quatro! Você quer?
- É chips?
- É sim! Mas te dou um só.
- Não, obrigada. Eu gosto de fruta. Você tem fruta aí?
- Fruta? Fruta eu não tenho não.
- Ah, que pena.
- Olha, a minha mala é maior do que a sua!
- E você é menor do que eu!
- Deixa eu te mostrar o que tem aqui.
- Não precisa não. Olha o seu pai, não quer que você abra a mala. Vai bagunçar tudo!
- Ah, outro dia eu te mostro então... Seu piercing não dói não? Que estranho.
- Não dói, não. Você tá indo pra onde?
- Não sei, papai que sabe. Seu pai te deixou furar o nariz? Vai inflamar!
- Meu pai deixou, mas só depois de muita conversa e da promessa que cuidaria bem do meu furinho.
- Ah, bom.
- Seu ônibus já tá saindo. Olha seu pai te chamando! Boa viagem!
- Vem também! Já tá na hora!! Você não vem nesse não?
- Nesse não. Tô voltando.
- Voltando pra onde?
- Tô voltando pra casa.

E elas nunca mais voltariam a se encontrar.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Saudade de Itaúnas,

Toda viagem, muito antes do dia da partida, se anuncia e se faz presente no contar dos dias. Um após o outro. Meu Deus, são tantos dias! Ninguém nos contou, mas esse mês de espera possui mais do que os habituais trinta ou trinta e um. Talvez seja essa a possível explicação para o lento passar do tempo. Tamanha expectativa parece não encontrar correspondência no desejo de tranqüilidade e paz. E é exatamente isso o que se busca quando se está de frente para o mar, no alto das dunas. Nos pés, um chinelo. No corpo, um biquini. Para os dez dias, mais que o suficiente. Nada agora possui qualquer importância. Elas não sabem o que as aguarda no futuro. Não sabem nada sobre o que ainda as fará sorrir e chorar, por diversas vezes. Não possuem qualquer idéia sobre os caminhos que lhes serão apresentados e, não conhecem ainda, os escolhidos. Mas não importa. As três, juntas, diante do mar de Dunas de Itaúnas reconhecem-se amigas e esperam, de braços abertos, o mar de bem que a vida para Elas reservou.

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Mãe minha,

Você vai pro forró hoje de novo? Ah não, Luiza, lavando o cabelo a essa hora? Não mexe aqui no computador! Para de comer alface, você anda comendo demais. Lu, vem deitar aqui comigo. Ô Luiza, para de conversar com esse menino. Lu, ele é um fofo! Já marcou o dentista? Já terminou de estudar? Bem que você podia ir comigo amanhã, hein! Filhinha, você me ama? Estou com saudade da Carolzinha. Hoje você vai ficar aqui em casa ne, vamos assistir um filminho, juntinhas. Gordinha, faz bolo hoje? Nossa, engordei tanto. Amanhã todo mundo vai fazer dieta aqui em casa. Ô Lu, vem fazer massagem. O que você está fazendo no meu quarto? Já ligou pra sua avó? Liliiina. Estou sem roupa! Não encontro uma blusa nesses três armários que tenho só para mim. Desliga esse forró, pelo amor de Deus. Vai fazer capoeira. Que linda, é a minha cara. Luiza! Cadê o meu relógio? Luiza! Cadê a minha bata branca? Luiza! Pela última vez, cadê minha calça de plush verde? Lu, hoje vou usar sua calça jeans. Trouxe um presentinho pra você hoje, toda vez que saio penso em você. Mãe, te amo.

terça-feira, 17 de junho de 2008

E a espera mais bonita, não poderia ser

Das coisas dessa vida
do muito que vivi
da falta que senti
do calor do teu abraço
do sorriso encantador
sinto falta do meu bem
me chamando de amor

O tempo vai o tempo leva
o tempo fica e só ficou
a lembrança de um beijo
do carinho do xamego
da menina bonitinha
de olhar tão matador

Ai meu Deus como queria
eu queria sim sinhó
merecer essa loirinha
que tem um perfume de flor

Que tem um perfume de flor
e essa menina quando dança
roda inteira no salão
ela não sabe, ela não vê
que balança o meu peito
desse meu pobre coração

E já vou logo avisando
Pra esses cabras do forró
é melhor ceis ir correndo
que ela é moça de respeito
vai casar com um menino
aventureiro e divertido
vai morar em joão pessoa
iluminar esse nordeste
com seus atos de amor

Ai meu Deus como queria
eu queria sim sinhó
merecer essa loirinha
que tem um perfume de flor

Pra terminar esse coco
Eu quero mesmo é dizer
que se vc não entendeu
o que disse nessa letra
não insista meu amor
confusão é seu dilema
e pra resolver esse problema
já vou logo te dizendo
é só mesmo com amor

Ai meu Deus como queria
eu queria sim sinhó
merecer essa loirinha
que tem um perfume de flor


domingo, 15 de junho de 2008

Flor Bonita, para Manoela

Manoela acordou triste hoje. Era difícil compreender porque ele (e hoje, Ela está fora da história) foi capaz de, em tão pouco tempo, mudar tanto seus habituais finais de semana. O forró não era o mesmo, os amigos não eram (apenas) os mesmos. Manoela não era a mesma. Mas não foi capaz de perceber isso a tempo. “Calma, Manu. Você é linda, inteligente e muito gente boa. Não merece sofrer por isso. A outra, a outra, ela é... piriguete. Você não”. Era muito bom ouvir essas palavras, apesar do termo “piriguete” tornar a frase um tanto irreverente e pouco séria. Era bom tentar enxergar que talvez assim tivesse sido melhor. Mas porque não conseguia, agora que tanto precisava, acreditar em tudo isso? Ela nunca pensou em namorá-lo. Nunca planejou momentos que não aqueles que tinham vivido juntos. Que não músicas embalando a alegria de um encontro inesperado. Conversas buscando conhecimento em um universo completamente novo.
Era verdade, Manoela não queria nada mais que isso. Bastava. E era natural que com a decepção viessem à sua mente outras decepções, outras pessoas, outras histórias. Para ela, todos esses “outras” haviam ficado para trás desde aquele domingo. Fazia tão pouco tempo e, meu Deus, como fazia tempo! E era justamente a Outra que, agora, representava o “balde de água fria” tão frustrante e conhecido. Hoje, nada a se fazer. E por isso, não precisava sofrer, chorar e pensar demais na noite de ontem. Coisa boa. Não era necessário continuar triste. Final de semana que vem tem mais forró!

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Nem branca nem preta

“Nossa, você está tão branquinha. O que aconteceu?”. Se para algumas pessoas a pálida e abatida aparência eram resultados de um rosto sem maquiagens, para Ela, duas semanas de correria combinada com tempo chuvoso eram suficientes para deixá-la mais amarela do que qualquer folha escondida da luz solar. Mas o que mais a incomodava, não eram as constantes confusões entre o seu estado de saúde e a sua cor. Era que, como um brinde adicional, não encontrava sobre o que nem como escrever. E, por isso, saíam textos assim, semelhantes a esse. Mas tudo bem, final de semestre é assim mesmo.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Caronas,

Ela só queria um tempo. Acreditava que se tivesse esse tão querido por todos, “tempo”, escreveria mais. E escrevendo, se entenderia mais. Seria bom ter tempo para conversar mais com os amigos, para fazer o que se gosta. Se tivesse mais tempo, poderia praticar exercício físico, estudar, ir ao forró, conhecer mais gente, fazer estágio, dar aula para criança. Quem sabe até fazer o seu inglês e sua auto-escola, ambos já iniciados, mas interrompidos pela tão famosa “falta de tempo”. Meu Deus era tanto a se fazer!
Mas de tudo isso, mais urgente era a auto-escola. Ela havia descoberto que autonomia se conquistava não com idade avançada ou maturidade atingida, apenas: autonomia se conquistava, principalmente, com uma carteira de motorista. Era isso, era preciso aprender a dirigir – legalmente (o que é importante lembrar).
Paradoxalmente a esse incrível desejo, estava um sentimento de perda. Todo esse tempo “a pé” permitiu a Ela fazer novos amigos, conhecer outros ambientes e, sobretudo, desenvolver sua paciência. Ela via até com certa alegria o trajeto diário do 5102, 1170 e finalmente, do 8103. Já podia dizer onde os três ônibus, e mais alguns, possuíam pontos e quem eram as pessoas que, todos os dias, a acompanhavam. Mas, mesmo considerando positivamente o transporte público, eram as caronas as principais responsáveis por deixá-la menos incomodada por não dirigir. Santas caronas. E Ela sabia valorizá-las.
Como era bom ir para o forró com o amigo que, pacientemente, escutava todas as suas dúvidas, ansiedades, medos, saudades. Coitado, ele escutava muito. E Ela gostava que ele escutasse.
Como era bom, também, voltar com o outro amigo. E, agora, era Ela quem escutava. E adorava escutar. E ria das histórias, dos “babados” da noite e das piadas mais sem graça. E descobria-se feliz. E descobria-se autônoma, nessa disfarçada falta de autonomia.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Seus pés,



Os pés dela hoje pareciam inquietos. Ainda era quinta feira e muito estava por fazer: terminar de ler o texto da prova, preencher os questionários de um trabalho, fazer o cartaz do estágio. Ah, mas seus pés. Seus pés se tivessem um pouco mais de autonomia do restante do corpo – esse corpo por muitas vezes incapaz de acompanhar o ritmo do tempo e talvez por isso, em especial o dela, se mostrasse sempre tão desengonçado, com as mãos, as pernas, qualquer outro membro, ou todos eles, fora de lugar (com exceção dos pés) – já teriam tudo por terminado, tamanha a ansiedade.
Mas o que as pessoas não compreendiam, e nem poderiam, é o sentido aplicável de “ansiedade” naquele contexto. Seus pés, maltratados desde a época da capoeira, quando foram obrigados a se adaptar à aspereza diária do chão da academia, do passeio onde aconteciam as rodas ou da própria rua asfaltada, eram os únicos membros de seu corpo seguros de si. Sem qualquer compreensão metafórica, eles sabiam onde pisavam. Sabiam se articular.
Quando Ela descobriu o forró, não havia percebido que o mérito de tal descoberta não seria conferido a si. Eram eles, os seus pés, os grandes responsáveis por apresentar a Ela o canto de dor, emoção e, sobretudo, superação do povo do sertão. E foi assim que Ela se encantou com Luiz Gonzaga e seus sucessores, capazes de, num contexto completamente urbano e individualista, manter um refúgio para a cultura brasileira, para a paz, para a alegria e para a unidade entre tanta diversidade. E foi assim também que os pés dela encontraram consolo.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Encontro com a Fé

Por Paulo Justino,

Eu pensava que era feliz, que tinha liberdade.
Pensava que era besteira esse negócio de orar.
Mas na verdade, eu era prisioneiro do ego, das coisas do mundo... e não era feliz.
Então, senti que estava só, que precisava de algo que desse sentido à minha vida; mas sabia também que esse algo não era deste mundo. Que tinha buscar em Deus. Mas qual Deus?
Tantos me foram apresentados. E, em cada um, eu vi Você.
Percebi então que minha busca estava apenas começando.
Quando fiquei cego para o mundo, eu Te vi.
Quando fiquei surdo, pude ouvir Sua voz maravilhosa, as orações e melodias que ela entoava. Tudo era Você... sinal de Sua criação.
Via Você no tronco de uma árvore, no desabrochar de uma flor. Via Você no sorriso de uma criança, nas lágrimas que caem dos olhos de alguém. Via Você em Krishna, Abraão, Buda. Você estava presente na vida de Moisés, Maomé, Zoroastro.
Ah, eu Te amei em Cristo, passei pela Porta e segui em Sua direção. Através dos ensinamentos do Báb Te encontrei e Te amo em Bahá'u'lláh, a Glória de Deus, Mensageiro da Paz, da Unidade, do Amor verdadeiro.
Acreditar, buscar. Isto é Fé.
Porque a Fé é um salto no escuro, nos braços de Bahá'u'lláh.
Quem não tem Fé, não salta... fica apenas no escuro.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Para Carol

Hoje Ela acordou mais cedo. Chegou em casa, ontem, mais de duas da manhã. Olhou o relógio, trocou de roupa e se viu diante de um quarto vazio. Duas camas de solteiro. O sono já havia lhe tomado o corpo. Deitou, mas a irresistível vontade de olhar para o lado não a deixou descansar por completo. Onde estaria agora? Fazendo o que? A uma hora dessas já estaria dormindo. Amanhã será que vai à praia? Em Salvador é verão o ano todo.
Ela nunca se atreveu a escrever sobre a irmã. Nunca lhe pareceu possível e mesmo encorajador traduzir em palavras tamanho amor, carinho e cumplicidade. A cada tentativa, todas frustradas, via-se diante da incapacidade de falar sobre aquilo de mais simples e puro que possuía – esse laço que envolve, enaltece, conforta e enleva. Mas Ela ainda conservava na ponta da língua, e no meio do coração (por mais brega que isso possa lhe parecer – e isso lhe parece), a mesma pureza de quando criança. Cheiro de mato, risada de neném, os primeiros tombos e as primeiras palavras. O mundo se construiu assim. Uma ao lado da outra. Juntas, foram sempre arroz e feijão, sol e mar, forró e música. E agora, essa saudade repentina pareceu apagar todas as desavenças, implicâncias e rivalidades, típicas de irmãs (principalmente gêmeas) que poderiam existir entre as duas. Ê saudade boa. Saudade que Ela sente lembrando-se de que nunca estará só. Mesmo sozinha, estará sempre acompanhada. As duas, agora, são só ternura. As duas, agora, são só saudade.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Ela, apresenta-se.

De outro jeito não pode ser. Decidir quais sapatos usar, ou qual música ouvir. Meu Deus, decidir o que comer. Tudo era tão difícil. Tudo apresentava-se, sempre, tão confuso que Ela não encontrava energias suficientes para refletir. Talvez por pensar demais, ou pensar que pensava demais, atribuía às mais profundas questões ares superficiais, envolvidos por uma névoa de confusões.
Ela era precoce. Amou demais, cedo demais. Leu muito. Manifestou toda a sua curiosidade. E escreveu tanto, que hoje sua pena não compreende mais belas frases e palavras coerentes com todo o seu desejo de expor o que sente. Ela nem ao menos sabe o que sente.