quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Devaneios julinos

São dezessete cadeiras à minha frente. Todas vazias, reluzindo ao calor do sol o branco limpo de uma manhã sem nuvens. Do salão, posso ouvir o barulho da vida lá fora: são carros que se apressam, pessoas que se cruzam, um avião que passa, vozes que não calam. Posso ouvir nosso mundo de dez dias. Do refeitório chegam até mim sons de esperança. São sorrisos alegres que nos exclamam o verdadeiro - o todo é, realmente, maior que as partes. E não ouço nada dentro de mim. Chego a me perguntar se um dia já ouvi.
Aos poucos, as cadeiras são preenchidas, uma a uma, pelas mais lindas e coloridas jóias. Embora jovens, são elas imensos repositórios de qualidades e mudanças. São as pérolas da mudança. Uma criança sorri e correndo se dirige ao centro. Em suas mãos não há muitas linhas. São mãos tão lisas... Diferentes daquelas que me acompanham por vinte e um anos: mãos já calejadas, já marcadas, já castigadas. Nem parecem mãos de uma jovem. Sem ter elas qualquer culpa, sozinhas, são a única porta pela qual todo o meu mundo se revela.
Será essa minha única compreensão sobre o meu mundo? Linhas marcantes, frágeis, contínuas e recortadas.
Um cachorro late e me chama à realidade. O vejo magro e marrom atravessar a grade da porta de ferro. Olho para Raul e o sinto bem próximo a mim - é o seu sorriso revelador dos nossos segredos e planos. Olho para as suas mãos e as vejo firmes e seguras. Tranquila, suspiro aliviada, pela certeza de que serão essas as responsáveis por, nas minhas mãos, fazer o sertão virar mar.